“Estava a pensar como é que se enquadra o livre arbítrio nisto que parecem os desígnios de Deus, no destino. Parece-me sempre que há coisas na minha vida que eu não escolhi mas aconteceram. Onde é que está então o livre arbítrio nisto?
A resposta surgiu-me, como tantas vezes, quase a par da pergunta. Para mim o livre arbítrio não é escolha momentânea, é escolha contínua, reflexo de todas as nossas atitudes, do que sentimos e de como nos ligamos uns com os outros. Por isso, por vezes o que acontece não é o que queremos e dizemos "não tive escolha". Mas tivemos, só que a escolha não é essa, a do desejo no momento, é o somatório de tudo o que fomos escolhendo, consciente ou inconscientemente no caminho percorrido até aí. Parece que o destino toma conta da vida mas na realidade o caminho que percorremos e a forma como o fizemos é que nos leva ao momento seguinte.
De milhentos exemplos que poderia dar vou dar um exemplo simples. Vamos imaginar uma pessoa que quer cuidar mais da saúde, sentindo mesmo que o deve fazer e sabe que isso, depois de conseguir, lhe dará qualidade de vida. Ao passar numa pastelaria vê um doce daqueles que engorda e faz colesterol e diabetes só de olhar, mas que lhe desperta um desejo momentâneo de o comer, que é irresistível. Quando decide ir comprá-lo quem estava antes dela leva os últimos doces que havia. A pessoa no momento sente-se desolada, pensa que não teve escolha, mas teve só que foi lá atrás, no momento em que quis ser mais saudável.
Pode também ver-se isto através das leis divinas a movimentarem-se e até podemos dizer que foi Deus que quis, mas não foi, fomos nós e Ele ajuda, se as escolhas forem para o bem maior (não para o do momento), para cumprimento do propósito, para nos encaminharmos para a trajectória já traçada no outro plano, também por nossa escolha. Deus ajuda a manifestar-se o que nós escolhemos, depois dizemos que Ele escreve certo por linhas tortas…
Às vezes a não concretização do desejo do momento leva à dor mas por detrás disto está sempre a nossa vontade maior e verdadeira, que vem do espírito e que se liga a Deus. Até temos a escolha de passarmos a vida inteira ao lado das verdadeiras escolhas, se nos adormecermos, se não permitirmos ter acesso às camadas mais profundas do espírito que somos. O espírito que somos é como uma flor se só expõe a sua beleza quando se abre totalmente. Não há comparação entre o que se vê num pequeno botão de rosa, verde e fechado, com uma rosa aberta e estou a falar apenas do que se contempla com a visão.
A questão do livre arbítrio, agora parece-me óbvio que assim seja e nem sei como me surgiram dúvidas. Parece-me fácil de entender porque consigo enquadrar tudo lá.
Até acho que se pode ter acesso ao futuro por aí, porque a estrada que estamos a percorrer fomos nós que a projectamos/ construímos, e não é ao trilha-la que o fazemos, é em antecipação, por isso às vezes pode não ser tão óbvio. Ou seja, com as escolhas do agora estou a construir a estrada que vou trilhar mais à frente. Sendo assim até acredito que somos nós que escolhemos o momento de desencarnar, pode é ser com mais ou menos antecipação. A distância desde o sítio em que estamos agora a caminhar até onde este já está construído, pode ser muito grande ou quase nula, e é dada pela firmeza e amor nos passos, ou seja, quanto mais conscientes estivermos, mais sólido e longo é o caminho. Este "longo" não é o tempo ou duração, é o avanço e alcance do propósito. O objectivo está cá guardado e o caminho também serve para o ir revelando, com a ajuda de Deus. Assim se ultrapassam os limites corpóreos, derrubando no íntimo as barreiras que giram em torno de conceitos aprendidos, chegando cada vez mais longe, à verdadeira dimensão dentro desta.”
Fernanda Cruz